Atualizado em 26/08/2024
Kitsune (狐) significa “raposa” em japonês. A palavra, no entanto, é uma onomatopeia do “kitsu”, que significa “o ganido da raposa”, e acabou tornando-se o nome do animal em tempos antigos. Hoje em dia, os japoneses usam “kon-kon” ou “gon-gon” para designar a raposa, já que a onomatopeia “kitsu” acabou no desuso.
É dito que, no Japão, sua imagem simboliza inteligência, sabedoria e, de acordo com relatos contidos em várias lendas à seu respeito, são animais com poderes mágicos (místicos), sagrados ou amaldiçoados. A kitsune é um dos personagens mais populares do folclore japonês.
Existem várias lendas relacionadas às kitsunes. Porém, não há uma certeza de sua origem (China, Coreia, Índia, Japão ou outros países da Ásia), no entanto, alguns registros relatam que, a partir do século IV d.C, a convivência das raposas com os humanos no arquipélago japonês era corriqueira, fato que pode ser relacionado à origem da kitsune.
Entretanto, histórias envolvendo kitsune são amplamente relatadas em dois registros antigos.
O primeiro é o livro Kojiki – a mais antiga crônica do Japão, compilado em 712 d.C. “Registro das Coisas Antigas”. O segundo é o Nihongi (também chamado de “Nihon Shoki” e “Hihongi”), este registro representa as “Crônicas do Japão”, compilado em 720 d.C. e contém parte da história “real” do Japão.
Lendas sobre as kitsune quase sempre englobam sabedoria. Feito isso, elas representam bem o velho ditado que diz “esperto como uma raposa”, visto que esse animal simboliza inteligência e sagacidade.
Acredita-se que todas as kitsunes sejam fêmeas, isso porque “histórias” a seu respeito quase sempre a denominam com nomes femininos.
Contam que as kitsunes geralmente são mais fortes que os seres humanos e por isso tendem a agir com arrogância sempre que entram em contato com um. Dizem que todas são dotadas com poderes incríveis, incluindo possessão, habilidade de cuspir fogo, manipular e surgir em sonhos, criar ilusões, dobrar o tempo e espaço, enlouquecer e até mesmo matar pessoas.
Dizem ainda que as kitsunes geralmente são invulneráveis aos ataques humanos. Porém, kitsune de natureza má pode ser derrotada pelos Taijiya, que são exterminadores especializados em Youkai (criaturas sobrenaturais). Diz-se ainda que os sagrados monges budistas –possuidores da benção divina de Buda– podem exterminar uma kitsune má apenas com uma simples oração.
Algumas variações de Kitsune
Ama-terasu no Kitsune
Diz-se ser a Deusa do sol “Amaterasu” que aparece na forma de uma raposa branca. Diz a lenda que se uma pessoa estiver passando por maus presságios e esta for devota da Deusa, Amaterasu atende as suas orações quando estas são de coração puro. Ela desce de seu reino em forma de uma raposa para apartar todo mau que a pessoa estiver passando.
Kitsune Bakemono
No Japão, de modo geral, a palavra bakemono representa “monstro”. Sendo assim, a Kitsune Bakemono é uma espécie extremamente má. Ela é espectral (como um fantasma), muito parecida com Reiko, Kiko e Koryo.
Genko
kitsune preta, normalmente é vista como um bom Omen (bom presságio).
Kiko
Espírito de uma kitsune. Normalmente, as ktsunes não são fantasmas, no entanto, elas podem aparecer como espíritos.
Kitsune
Termo geral para a palavra “Raposa”, kitsunes podem ser retratadas tanto como boas ou más em suas lendas.
Kitsune-bi
Kitsunes com o poder de invocar chamas através de sua boca e de sua cauda.
Kitsune Tokoya
Essa é uma kitsune perita em pregar peças e disfarçar-se em humanos. Dizem que em uma pequena província no Japão, uma kitsune disfarçou-se de barbeiro, deixando careca todos os clientes. Assim, todos os moradores da vila ficaram de cabeças raspadas. Por isso, o animal encantado acabou ganhando o apelido de Kitsune tokoya, ou seja, “raposa barbeira”.
Kitsune Kamisori
Tal como a Tokoya, a Kitsune Kamisori gosta de pregar peças. Contam que um clã de raposas desobediente que vivia em um campo na província de Niigata costumavam raspar a cabeça de todas as pessoas que passavam pelo campo. Mediante isso, essas raposas passaram a ser chamadas de Kitsune Kamisori (Raposas Navalha), isso porque kami sori é literalmente “navalha” em japonês.
Koryo
Kitsune Amaldiçoada.
Kuko
Kitsune do elemento ar. Kukos são kitsunes muito más.
Kyuubi no Kitsune
São as kitsunes que alcançam os 1.000 anos. Nessa idade, a cor de sua pelagem muda para prateada ou dourada. Alcançam até 9 caudas e é quando ganham a habilidade de poder ver e ouvir tudo em qualquer lugar no mundo, atingindo assim, a sabedoria infinita e onisciência.
Nogitsune
Estas são as kitsunes selvagens, que não seguem regras, podem até ser assassinas. O nome Nogitsune, porém, é normalmente usado para diferenciar entre as boas e más kitsunes. Sendo assim, o termo “kitsune” é destinado às boas raposas, aquelas que seguem e são mensageiras do Deus Inari. Já as “raposas” que não respeitam Inari, são chamadas de Nogitsune.
Algumas Nogitsune são extremamente maléficas, podendo aparecer na forma física ou como espírito obsessivo, com o poder de tomar o corpo de uma pessoa. Contam que o possuído faz suas vítimas sofrerem, perturbando-as por vários dias antes de matá-las.
Dizem ainda que quando um assassino em série tem histórico de “boa pessoa” antes de virar assassino é porque ele foi possuído por uma Nogitsune.
Porém, nem toda espécie de Nogitsune é necessariamente má ou assassina. Existem algumas que apenas gostam de pregar peças nos seres humanos, como a Kitsune Tokoya, com o diferencial de que as “brincadeiras” das Nogitsunes são mais “pesadas”.
Reiko
Fantasma de uma kitsune. Essa variedade não é propriamente má, contudo, há algumas lendas que a descreve “muito maliciosa”.
Shakko
É uma kitsune vermelha e pode ser considerada tanto má como boa, uma vez que ela não tem o conhecimento do que é moral, ou seja, se vê o bem, será boa, mas se receber o mal …
Tenko
Kitsune celestial. Não são consideradas tão más como a Bakemono-Kitsune, ou tão benevolentes e sábias como as mensageiras do Deus Inari.
Yako / Yakan
Termo geral para a palavra “Raposa”, ou seja, o mesmo que kitsune.
Kyuubi no Kitsune
Além das kitsunes especificadas acima, existe uma infinidade de variações dessa criatura e cada qual com suas histórias. A mais famosa, no entanto, é a Kyuubi no Kitsune (raposa de nove caldas).
Diz-se que a cada cem anos uma nova cauda nasce e, a cada cauda adquirida, seus conhecimentos e poderes aumentam. Um desses poderes é o de transfigurar-se na forma humana. Algumas lendas contam que elas usam esses poderes para enganar as pessoas, outras dizem que são amigas e companheiras fiéis ou até se tornam lindas e amorosas esposas.
O máximo de caudas que uma Kyuubi no Kitsune pode alcançar são nove, mas esse número ocorre apenas quando atinge os 1.000 anos de idade. de acordo com o Kojiki.
Ao nascer da nona cauda, sua coloração muda para prateada ou dourada e, a partir de então, elas passam a possuir sabedoria infinita e capacidade de ouvir qualquer coisa, incluindo pensamentos dos humanos. Isso que dizer que ela adquire a onisciência ou omnisciência, que é deter toda sabedoria, saber tudo que seja cognoscível, incluindo pensamentos, sentimentos, vida, passado, presente e futuro.
Sendo assim, quanto mais cauda tiver, mais poderosa será a Kyuubi no Kitsune.
Existe uma lenda que é considerada a mais popular e famosa sobre uma espécie de Kyuubi no Kitsune. Trata-se da kitsune “Tamamo-no-Mae”, a mais maldosa de todas. Algumas dessas espécies não são simplesmente más, mas quando decidem ser, são capazes de transforma-se em verdadeiras assassinas em série.
Principais lendas sobre Kitsune
Kitsune Tamamo-no-Mae
A kitsune mais maldosa de todas, sem dúvidas, foi a Tamamo-no-Mae, que ao longo de sua existência conseguiu infiltrar-se nos tribunais imperiais da Índia, China e Japão, e causar tantos danos e mortes que fora considerada uma Criminosa Internacional, procurada em todo o continente Asiático.
Essa criatura levou destruição ao rei da Índia, matando milhares de seus súditos antes de fugir para a China, onde foi responsável pela queda da dinastia Chou, para reaparecer, tempos depois, no Japão como uma cortesã do Imperador Konoe, também chamado de Imperador Toba.
Kitsune Tamamo-no-mae no império japonês
Sua sabedoria e beleza encantavam o povo japonês, a corte Imperial e, principalmente, o imperador. Tamamo-no-mae era considerada a mulher mais bela e inteligente do Japão. O Imperador Konoe apaixonou-se por ela e logo depois foi acometido por uma doença inexplicável. Médicos, Monges e até filósofos tentaram em vão descobrir a causa da enfermidade de Konoe.
Quando o Imperador já dava sinais de que sua morte era certa, finalmente um astrólogo da corte chamado Abe no Yasuchika (também descrito com o nome de Abe no Seimei ou Abe no Yasunari), que era descendente de uma kitsune, descobriu facilmente que Tamamo-no-Mae era a causa da enfermidade. Yasuchika explicou que aquela linda moça era, na verdade, uma Kyuubi no Kitsune disfarçada, e que tinha o intuito de usurpar o trono de Konoe.
Assim que descoberta, o boato espalhou-se e Tamamo-no-Mae fugiu para as planícies da Nasu. Depois de muitas buscas em vão, o Imperador mandou chamar Kazusa-no-Suke e Miura-no-Sube, que eram os guerreiros mais poderosos do Império na época.
Os dois guerreiros, porém, foram diversas vezes ludibriados na caçada até que, um certo dia, Tamamo-no-Mae apareceu em sonho para Miura e rogou para que ele poupasse sua vida, pois ela havia tido o mau presságio de que Miura a mataria no dia seguinte. Porém, sem nenhuma piedade, Miura recusou.
Na manhã seguinte, finalmente os guerreiros conseguiram encurralar Tamamo-no-Mae na planície de Nasu. Justamente Miura foi quem a matou com uma flechada.
O corpo da kitsune foi transformado em pedra e passou a ser chamado de Sessho-Seki “Pedra da Morte ou a Pedra da Matança”. Conta a lenda que qualquer criatura viva que entrasse em contato com a pedra morria imediatamente. Tamamo-no-Mae tinha se transformado em um poderoso Hoji, também chamado de youkai (espírito maligno e/ou demônio) de tão poderoso que era o mau dessa raposa. Seu espírito assombrou a pedra por tempos.
O mau Sessho-Seki, no entanto, teve o seu fim quando, um certo dia, o Sagrado Monge budista Genno parou para descansar debaixo da pedra e foi assombrado por Hoji. O monge então se pôs imediatamente a recitar as orações sagradas de Buda, conseguindo finalmente exorcizar a pedra Sessho-Seki.
Nos dias atuais, tanto a rocha como as planícies e encostas do Monte Nasu são os principais destinos turísticos de curiosos e daqueles que acreditam ser o local em que Tamamo-no-Mae morrera no Japão. O local abriga uma grande rocha vulcânica e a qual é creditado estar aprisionado o espírito diabólico de Tamamo-no-Mae.
Embora a história de Tamamo-no-Mae faça parte da mitologia japonesa, ela também consta nos antigos livros de história “real” do Japão, nos quais relatam sobre o Imperador Toba, que teve seu império ameaçado por uma bela, e maligna, cortesã que, após descoberto seu plano, foi morta e “enterrada em uma rocha”, diz o registro.
Ono e a Kitsune do Pântano
Existe uma lenda de kitsune considerada uma das mais antigas estórias a seu respeito. Porém, dizem tratar-se de uma lenda falsa, no entanto, qual lenda pode-se afirmar verdadeira? Ainda mais por tratar-se de uma das lendas mais antigas sobre kitsune. Em fim, vamos a ela.
Ono, um habitante de Mino, passou muito tempo ansiando encontrar uma mulher com a beleza que ele considerava ideal. Um dia, quando andava no pântano, encontrou uma linda mulher. Ao vê-la, Ono se apaixonou imediatamente e acabou casando-se com ela.
Assim que nasceu seu filho, o homem resolveu criar um cachorrinho. O animal, no entanto, à medida que crescia. ficava mais hostil com a esposa. Por diversas vezes ela implorava para que o marido o mata-se, mas ele sempre se recusava por gostar demais do animal.
Um dia o cão a atacou com tanta ferocidade que ela involuntariamente retornou a sua forma original de raposa e fugiu.
Enquanto a raposa corria desesperada, Ono gritou para ela: “Você pode ser uma raposa, mas é a mãe de meu filho e eu te amo. Volte sempre que quiser, você será sempre bem vinda”.
Assim, toda noite ela voltava para os braços de Ono. A kitsune retornava à noite como humana e de dia deixava a casa como raposa. Ela foi apelidada de Kitsune, que em japonês clássico é “kitsu-ne” (venha e durma) e ki-tsune (venha sempre).
Kitsune na cultura popular japonesa
Incorporado no folclore Japonês como elas são, kitsunes aparecem em numerosas peças dos quatro principais teatros tradicionais do Japão (No, kyogen, bunraku e kabuki). As obras foram criadas a partir de contos populares.
Kitsunes também são usadas em obras contemporâneas, tais como filmes, animes (desenho animados japoneses), mangás (desenho em quadrinhos japoneses) e games.
Essa personagem do folclore japonês aparece em Pokémon como Ninetales, um dos monstrinhos da mundialmente famosa franquia japonesa.
A aparição mais famosa de uma kitsune em anime acorreu no anime Naruto, no qual ela figura como uma Kyuubi no Kitsune, ou seja, raposa de nove caudas, que vive selada dentro de Naruto, personagem principal da série.
Alguns ídolos de bandas musicais japonesas usam mitos sobre as kitsunes em suas letras, e incluem o uso de máscaras de raposas, sinais de mão e interlúdios de animação durante os shows ao vivo.
A kitsune figura ainda em jogos, cinema e em vários festivais japoneses. Mediante isso, esse personagem é considerado o mais popular do riquíssimo e milenar folclore japonês.
Por Maria Rosa (Artigo criado originalmente em 2006)
Fontes principais de pesquisa
• Livro Legends of Japan
• Livro História da Cultura Japonesa
• Livro Kurobe no Tsunko Gitsune
• Site Minwa Fujipan
• Instituto Nacional do Patrimônio Cultural do Japão
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